Pois é, não tem jeito, pelo visto, não engano mais ninguém mesmo. Alguns
anos atrás, o fato revelador deu-se entre as gôndolas de um supermercado e
configurou-se plenamente desculpável, inocente, despretensioso até, quase
passível de ser deixado de lado, relegado ao esquecimento. No entanto, eu é que
não sabia, mas já se tratava de um sinal amarelo dando o seu alerta. Agora, o
fato repetiu-se na maternidade de um hospital e, dessa vez, não teve nada de
desculpável, nem de inocente, muito menos de despretensioso. Foi o sinal
vermelho mesmo quem ligou a sirene e passou a anunciar insistentemente, em alto
e bom som, para quem quiser e para que não quiser escutar (entre estes últimos,
eu mesmo): “Marcos, você tem cara de “´nono´”!
Cara, cabelo (especialmente), jeito, porte e... idade! Mais do que tudo,
antes do que tudo, acima de tudo: idade! Dizem que ela não vem sozinha, e
parece que não vem mesmo. No entanto, é preciso acumularmos uma coleção de
sinais (primeiro os discretos amarelos, depois, os escandalosos vermelhos) para
que nos convençamos de que o tempo já fez a curva da existência lá atrás, a alguma
quadras, quando ainda pensávamos que seria possível seguir pirilampeando pelos
campos do Senhor sem que a fatura um dia fosse apresentada. O sinal amarelo foi
aceso, no meu caso, uns cinco anos atrás, quando fui às compras em um
hipermercado e, ao meu lado, no setor de enlatados, uma jovem mãe carregava no
colo o filhinho de uns dois anos de idade. Ao se aproximarem de mim, na seção
das ervilhas, o garotinho me viu, estendeu o bracinho e exclamou: “Nono!”.
Confundiu-me com seu avô, o pequeno consumidorzinho, para o enrubescimento
instantâneo da constrangida mãe e também o meu.
Dias atrás, foi a vez do sinal vermelho. Estava posicionado, já pronto
para babar assim que aparecesse pelo vidro da maternidade a figura de minha
sobrinha, cujo gritinho ao nascer minha esposa escutara de longe pelos
corredores do hospital, quando um senhor ao lado, que observava pelo mesmo
vidro seu recém-nascido segundo neto, me olhou e perguntou: “e você, esperando
para ver seu netinho também”? Tóin! Não, não era o netinho, era a sobrinha que
eu aguardava. Não tenho netos, não sou “nono”, apesar de exibir frente aos
olhos do mundo todas as credenciais para essa condição familiar: os cabelos
brancos, as entradas e bandeiras que avançam testa adentro, o jeito inconfundível
de quem já acumula décadas nas costas.
Não, não sou “nono”. Mas aceito de bom grado a confusão que provoco.
Afinal, estou no lucro: ninguém ainda me chamou de “bisa”...
(Crônica publicada no jornal "Pioneiro", de Caxias do Sul, em 19 de fevereiro de 2018)
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