segunda-feira, 18 de setembro de 2017

Velhas novas sobre a Terra

Parafraseando um antigo e respeitado filósofo uvanovense, “não há o que não haja”. E não há mesmo como não evocar o certeiro adágio quando deparamos com determinadas informações que nos chegam diuturnamente por meio das mídias falada, escrita, televisionada e navegada. Descubro, por exemplo – não sei se a madama já estava sabendo –, que anda ganhando volume e força um movimento mundial que reúne pessoas comungantes de uma mesma certeza: a de que a Terra não é redonda, mas, sim, plana. Isso mesmo, madama, tem gente (e muita gente, por sinal) em pleno século 21 que está convicta de que nosso planeta é chato, além de, algumas vezes, também enfadonho. Incrível, pois não?
Autointitulam-se eles como “terraplanistas”, em oposição a gentes como a madama e eu, que batemos o pé no chão ao insistirmos na antiga crença de que a Terra é redonda; somos os “globalistas” (de minha parte, preferiria um termo mais poético, como “redondistas” ou “terrabolistas”, a senhora não concorda?). De qualquer forma, não se trata tão-somente de apenas duvidar do que reza a ciência moderna em relação ao formato do planeta que habitamos, como uma avaliação mais, digamos, plana, tenderia a apontar. Não. Os “terraplanistas” fundamentam a sua crença sobre eventuais falhas na sustentação da tese de que a Terra seria redonda, e vão aos fatos, elencando-os e desenterrando o debate.
Ou seja, o que se pode perceber é que está na moda vasculhar o passado e ressuscitar antigos conceitos, trazendo-os de novo à tona, insuflando-lhes sobrevida. Isso, em vários aspectos, não só em questões científicas. O boneco Falcon, da Estrela, por exemplo, que citei aqui nesta crônica de segunda, na segunda última. Descubro agora que, coincidentemente, a marca de brinquedos que o fabricava décadas atrás decidiu reeditar o boneco para celebrar os 80 anos da empresa, evocando produtos que fizeram história entre as crianças do passado.

Mas olha, madama, vou lhe dizer uma coisa. Enquanto essa onda “revival” de trazer para o presente as coisas do passado se restringir a teorias científicas sobre a esfericidade da Terra e a brinquedos que ficaram na memória, estará tudo muito bem. Problema, mesmo, é quando esse tipo de movimento começa a querer revitalizar visões de mundo totalitaristas, ditatoriais e segregacionistas, que a História tanto penou para extirpar. Tipo a censura prévia a bens culturais, por exemplo, como se fazia na Alemanha nazista, na Rússia stalinista, no Brasil ditatorial. Daí, sim, o caldo entorna, como diziam os antigos. É preciso ficar atento.
(Crônica publicada no jornal "Pioneiro", de Caxias do Sul, em 18 de setembro de 2017)

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