segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

A resistência das rosas

Eu sei que é roubada comprar rosas no pico do verão, mas, quando percebo, já é tarde. Hábitos falam mais forte quando cultivados com zelo e isso vale para tudo: amizades, relacionamentos, restaurantes, bons e maus comportamentos, formas de pensar, maneira de escovar os dentes, leituras, churrasco de domingo, aquisição periódica de rosas e mais tudo aquilo que a amiga leitora e o estimado leitor quiserem acrescentar por conta de suas vivências. Quando vi, estava com o buquê deitado no banco do caroneiro, mais uma vez, como faço às sextas-feiras.
Flores trazem vida, cor e clorofila à casa, especialmente quando não se tem habitando nela nenhum gato, cachorro ou peixe de aquário. Às sextas-feiras, em uma esquina do bairro próxima daqui de casa, paro o carro ao lado da van do florista ambulante cujas portas escancaradas ofertam aos transeuntes diversos buquês de rosas com cores variadas. Tem de tudo que a imaginação e a palheta de cores possa criar: rosas vermelhas, rosas brancas, rosas cor-de-rosa, rosas lilás, rosas azuis, rosas verdes, rosas bicolores, rosas bege, rosas salmão, rosas amarelas. Gosto de variar e me divirto com as cores mais esdrúxulas, ciente de que são tingidas artificialmente, mas tudo bem, o que vale é o efeito.
Às vezes, adquiro dois buquês para mesclar as cores nos diversos vasos que depois a esposa espalha pelas peças da casa. Até os banheiros são brindados com a presença floral, porque, afinal de contas, aqui em casa, banheiro também é gente, se me permitem a metáfora pobrinha. E faço isso de caso pensado. Sei que a expectativa de vida das florezinhas não ultrapassa uma semana, período em que esperamos delas apenas que os botões se abram e preencham os ambientes com o perfume, as cores e a alegria de serem rosas. Depois, cumprem o seu destino: murcham, morrem, vão fora e dão espaço para os buquês da semana que vem. Assim é a vida das rosas, sobre as quais já aprendemos singelamente com o poeta que são rosas, são rosas, são rosas...

Mas no duro do verão a coisa é diferente. As rosas compradas sexta-feira passada não duraram sequer três dias e já estão flácidas nos vasos, murchas, tristes e acabadas. A rosinha amarela infiltrada no meio do buquê carmesim ainda que tenta manter a imponência, rainha em meio ao mar de murchismo protagonizado pelas demais. Efeito do calor, claro. Mas não desisto. É uma questão de honra não abandonar esse hábito. Afinal, se uma rosa é uma rosa, a poesia também será sempre poesia, apesar do calor abrasante. Contem comigo na sexta que vem!
(Crônica publicada no jornal Pioneiro, de Caxias do Sul, em 16 de janeiro de 2017)

Nenhum comentário: