Já sou conhecido pela turma de carteiros e carteiras que
atendem o bairro em que moro, uma vez que demando deles bastante trabalho na
entrega de encomendas que faço via postal, atraindo até minha casa livros,
revistas, discos e filmes para completar minhas inextinguíveis coleções. “Encomenda
para o senhor Marcos”, avisa pelo interfone o bravo funcionário da Empresa
Brasileira de Correios e Telégrafos, e lá despenco eu do décimo-primeiro andar,
pantufas nos pés, coração ansiado acompanhando o visor do elevador a me desembarcar
logo no térreo para que possa descobrir qual encomenda chegou e pelas mãos de
qual de meus já amigos carteiros: o senhorzinho que gosta de ler e que já foi
presenteado com livro de minha autoria; a moça da van de Sedex; o rapaz da
motocicleta ou a rapariga caminhante.
Dessa vez é a rapariga caminhante, simpática (como todos)
e conversadora, que entrega o pacote e pede para assinar na linha marcada. Hoje
ela veio cedo e me achou em casa. “Não o tirei da cama, senhor Marcos?”,
brinca. “Não, eu sabia que você viria e já estava cedo de guarda”, devolvo,
assinando na linha ao lado do xis. Pelo jeito, ela gosta do que faz e
compartilha uma sutileza de sua profissão que até então eu sequer desconfiava: “A
campanha eleitoral dificulta nossa vida; as caixinhas de correio ficam lotadas
de propaganda e santinhos e não sobra espaço para colocarmos a correspondência”.
Verdade, não havia percebido isso. É importante que nós, moradores/eleitores,
mantenhamos nossas caixas de correspondência regularmente esvaziadas, especialmente
em período eleitoral, sob pena de não recebermos nossas encomendas e nossas
cartas (cartas, não, que ninguém mais recebe carta, mas as faturas, as contas,
os boletos e as multas de trânsito).
Vejo-a trotar rua abaixo com a pesada sacola às costas e
me invadem a mente as belas palavras do lema dos carteiros norte-americanos,
que diz mais ou menos assim: “Nem a neve, nem o frio, nem a chuva, nem o calor
e nem a escuridão da noite impedirão estes carteiros de cumprir com agilidade as
missões que lhes foram designadas”. O belo lema deriva da descrição que o
historiador grego Heródoto (484 a.C. – 425 a.C.) fez do Angarium, o incrível
sistema de mensageiros que existia na antiga Pérsia no século cinco antes de
Cristo e que garantia o fluxo de informações naquela região. Se tanto na Pérsia
quanto nos Estados Unidos nem a chuva nem a neve impossibilitam o trabalho dos
carteiros, aqui no Brasil tampouco os santinhos eleitorais os impedirão de
cumprir suas missões. Façamos votos.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 25 de agosto de 2016)
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