Olha, madama, vou lhe segredar uma coisa: se seu neto anda
voltando desolado de passeios súbitos por diversos logradouros da cidade,
infeliz por não estar conseguindo encontrar algum Pokémon pela aí, pode ter
certeza de que ele se escondeu aqui em casa. Quem? Seu neto? Não, madama, o tal
do Pokémon que ele caça. A Pokemonada toda parece que cansou de ser facilmente
encontrada pelos celulares alheios e andam fugindo para cá, deixando a ver
navios os caçadores de Pokémon na Praça Dante, nos pátios da UCS, na Avenida Júlio
de Castilhos. Se é para brincar de esconde-esconde, eles decidiram radicalizar
e vieram todos se esconder aqui.
Aqui tem Pokémon no banheiro, tem Pokémon embaixo da cama,
tem Pokémon em cima da televisão, tem Pokémon enfiado na lata de biscoitos, tem
Pokémon dormindo nas minhas pantufas, tem Pokémon congelado no freezer, tem
Pokémon por tudo, madama. Tenho certeza de que o Pokémon perdido de seu neto
está aqui entre eles. Pode mandar vir buscar, que é um favor que a senhora me
faz. Entrego-o banhado e penteadinho.
Não é que eu me incomode com a casa atopetada de Pokémons
espraiados por todos os cantos, longe disso. Até gosto da companhia que fazem,
tiram aquele ar de solidão que costuma invadir uma casa quando não se tem gato,
cachorro, periquito, tartaruga ou calopsita de estimação. Eles são minúsculos,
silenciosos e amarelos. Um tanto agitados, sim, mas basta cuidar para não
esmagar nenhum deles ao andar pela casa que tudo segue com certa tranquilidade.
Não me importo que oito deles estejam sentados sobre a tevê quando, à noite, me
ponho a acompanhar o salto com vara nas Olimpíadas. Eles torcem junto comigo e
já andamos até ensaiando, com relativo sucesso, umas “olas” no sofá da sala.
O que incomoda, mesmo, madama, são os caçadores de
Pokémons. E se descobrirem que aqueles mais difíceis de encontrar estão se
escondendo aqui em casa? Com os Pokémons até ando aprendendo a lidar, mas os obstinados,
fissurados e obcecados caçadores de Pokémons, o que se faz com eles, madama? A
senhora veja seu neto! Não tira o nariz do aparelho celular, caçando Pokémons o
dia todo, do café da manhã à janta, não é mesmo? Ele caça Pokémon no banho,
caça na xícara do café, caça no prato de mingau, caça dentro do ônibus, é um
inferno! Como lidar com ele?
Eu, aqui, tenho adestrado os Pokémons que se enfiam dentro
de minha casa. Meto bons filmes no DVD, toco música de qualidade no aparelho de
som e promovo rodas de leitura. Os seus, eu não sei, mas os meus Pokémons não
vão gastar tempo caçando Pokémons pela aí, não.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 19 de agosto de 2016)
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