quarta-feira, 3 de agosto de 2016

Desesperar na espera, jamais!

Ao longo de nossas existências, vamos acumulando horas e horas de nosso precioso tempo de vida a aguardar em salas de espera ou em filas em geral. Sempre que pacientes, aguardamos nas salas dos consultórios médicos, dentários, fisioterapêuticos, clínicos, psicológicos, estéticos. Sempre que impacientes, nas salas de órgãos públicos, estabelecimentos privados, filas de bancos, do pão na padaria, do caixa de supermercado, do barbeiro, da manicure, para a compra de ingressos, para a entrada em espetáculos e assim por diante, não me estendo nos exemplos porque a madama já entendeu o cenário que busco tecer nestas mal digitadas mundanas de hoje.
No que tange à administração de meu próprio tempo nessas ocasiões, aproveito, sempre que possível, para dar andamento às minhas leituras de livros, o que reveste o período de espera em prazer e exorciza a sensação de desperdício de vida. Experiente que sou no quesito “presença em salas de espera, filas e afins”, não deixo de deitar meu olhar observador ao avanço das tecnologias e às facilidades que também chegam à população nessas situações, bem como as transformações de comportamento que elas provocam. As televisões, por exemplo, hoje são presenças quase que absolutas nos ambientes em que se dá o fenômeno humano da espera, roubando as atenções que, até décadas atrás, dirigiam-se para as mesinhas de centro nas quais repousavam os jornais e revistas velhos.
Revistas e jornais, hoje em dia, jazem quase que intocados nesses locais, nos quais as atenções se dividem entre os smartphones carregados junto pelos esperantes e os aparelhos de televisão, via de regra sintonizados em canais que, no momento, estejam transmitindo programas culinários. Muito tenho aprendido sobre receitas gerais nos últimos tempos nas salas de espera, filas de banco e assemelhados, ao desviar os olhos das páginas de meus livros e cravá-lo na tela televisiva em que Ana Maria Braga despeja temerariamente o conteúdo pardo e viscoso de um liquidificador dentro de uma tigela que rapidamente mete dentro do forno. O que será aquilo? Não acompanhei o processo desde o início, portanto, não sei os ingredientes utilizados e tampouco o procedimento para obter aquilo que vi.

Mas o comentário da senhora ao meu lado, a respeito das ameixas utilizadas, me dá pistas. Tentarei algo em casa à noite. Afinal de contas, esse tempo não pode parecer desperdiçado. Ou, quem sabe, seja mais seguro dar sequência à leitura do livro. A receita de Ana Maria Braga entrará na fila dos projetos não cumpridos.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 3 de agosto de 2016)

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