Cheguei à conclusão de que a
parte do corpo humano que mais mata é a boca. Morre-se de tudo, é verdade, mas
muito se morre pela boca. Morre-se, por exemplo, por comer demais e também por
comer de forma errada. Morre-se ainda pela falta de haver o que a boca comer,
que é a mais triste das mortes possíveis neste mundo de injustiças. Morre-se
por não se higienizar corretamente a boca, propiciando o surgimento de doenças.
Morre-se pela boca também metaforicamente, como quando “caímos de boca” sobre
alguma prática ou hábito que se revela pernicioso e fatal a nós mesmos, no
final. E morre-se figurativamente pela boca quando falamos demais. Óbvio que,
em se tratando isto aqui de crônica literária mundana, é sobre esse último tipo
de morte figurada pela boca que vou me debruçar nas próximas linhas.
Morrer pela boca é falar (ou
escrever) o que não deve, de forma impensada, antecipando-se aos fatos e às
luzes que melhor poderiam clarear um assunto caso nos resguardássemos a
refletir mais sobre ele antes de abrirmos a bocarra e sairmos dando pitaco a
torto e a direito sobre qualquer tema, conduzidos pela ânsia de nos fazermos
notar. A morte figurativa pela boca decorre, na maioria dos casos, da
necessidade de exposição que possui o ego humano (e seu narcisismo inerente),
quando não devidamente controlado. Nesses casos, somos iguais aos peixes que
não pensam duas vezes em meter a boca na saborosa minhoca que não passa de isca
a esconder o anzol fatal que lhes arrancará das águas nas quais até então
navegavam e os transformará em banquete na mesa dos pescadores. E bom pescador,
bem o sabemos, precisa ser paciente. Peixe de boca grande vira banquete na mesa
de pescador paciente. Bonita a metáfora.
Paul McCartney, o ex-Beatle, deu
nos dedos (ou na boca?) do extinto grupo Oasis, esta semana. Lá pelos idos de
1996, no auge do sucesso, Noel Gallagher, vocalista do Oasis, cometeu a
imprudência de afirmar que sua banda era maior do que os Beatles. Vinte anos
depois, McCartney sussurra palavras de sabedoria, deixando estar: “O Oasis era
jovem, fresco, eles estavam escrevendo boas canções, mas acho que o grande erro
que eles cometeram foi quando disseram 'nós seremos maiores que os Beatles’.
Pensei: 'tantos já disseram isso, e esse é o beijo da morte'. Seja maior que os
Beatles, mas não diga. Quando você diz isso, tudo o que fizer a partir de então
será visto à luz dessa declaração”. Em resumo: ser mais e dizer menos. Fazer
mais e falar menos. Pensar mais e falar menos. Uma boca silenciosa e paciente
pode render o melhor dos peixes no jantar.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 1 de junho de 2016)
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