Uma notícia triste divulgada há
poucos dias movimentou o cenário nacional dos quadrinhos, causando preocupação.
O jornal “Folha de São Paulo” divulgou, no dia 8 de maio (domingo passado), que
o cartunista Angeli não participará mais da sessão diária de tiras em
quadrinhos do periódico. Isso põe um ponto final a uma saga de 33 anos
contínuos, por parte do quadrinista, de publicação de cartuns diariamente em um
dos mais significativos órgãos de imprensa do país. Quanto dá isso em volume de
produção? Vejamos. Iça-se a máquina calculadora da gaveta e aplica-se a fórmula
básica: digamos que cerca de 360 tiras por ano vezes 33... Chega-se a um total
mínimo de 11.880 tiras publicadas. É coisa! E deve ser mais.
Angeli, paulistano, 59 anos de
idade (nasceu em agosto de 1956), é um dos grandes ícones dos quadrinhos
nacionais, tendo participado da geração de artistas que revolucionou e conferiu
novo gás a essa arte nas décadas de 1980 e 1990, juntamente com cartunistas
como Laerte, Glauco, Luiz Gê, Adão Iturrusgarai e outros. Os nomes desses
artistas podem até soar apenas ligeiramente conhecidos ao estimado leitor e à
prezada leitora, mas certamente as criações vindas do talento deles lhes são
mais familiares. Aos exemplos. Laerte (64 anos) consagrou-se criando “Os Piratas
do Tietê” e fez, juntamente com Glauco e Angeli, a série “Los Três Amigos”. Glauco,
criador do personagem “Geraldão”, morreu assassinado por um fanático religioso
em 2010, aos 53 anos. Luiz Gê foi um dos editores e ativos colaboradores da
revista “Circo”, e o gaúcho Adão Iturrusgarai é o criador de personagens como
“Aline” e o casal de caubóis homossexuais “Rock & Hudson”.
E Angeli? Ora, Angeli tem na
conta a criação de figuras marcantes como “Os Skrotinhos”, “Rê Bordosa”, “Bob
Cuspe” e muitos outros. Por que, então, essa súbita freada em sua produção
diária para a “Folha”? Simples (só que não): o cartunista sofre de depressão e
precisa focar todas as suas forças no tratamento da crise pela qual está
passando. E não há como fazer graça quando o mundo interno e externo se
apresenta pesado e sem graça. A depressão é uma doença maliciosa, que se
infiltra sem avisar, devagarinho, sendo de difícil detecção por quem sofre dela
e pelas pessoas ao seu redor. Mas Angeli não se abate. Seguirá participando eventualmente
de outros espaços semanais no jornal, afinal, o desafio da tira de papel em
branco e o lápis na mão, para um cartunista, ainda são seus melhores
instrumentos de batalha frente à vida. Nós, do lado de cá das páginas, ficamos
na torcida.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 12 de maio de 2016)
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