sábado, 9 de janeiro de 2016

Arrabaldeando

Nós, caxienses natos ou por adoção, vivemos em uma cidade em constante processo de mutação, que não conhece estagnação. Caxias do Sul está sempre em crescimento, mutante, ativa. Independentemente de crises econômicas, respira a necessidade de mudar, de se adequar, de se reinventar. Isso está no DNA da cidade e seus reflexos podem ser detectados em todo o amplo espectro da vida cotidiana em comum, que comungamos, nós, caxienses natos ou por adoção.
Eu, por exemplo, que não moro no centro, mas em bairro, e que dirijo meu automóvel, mantenho há anos uma queda-de-braço interessante com o sistema viário do município. Com o crescimento constante da frota e do número de motoristas a disputarem o exíguo espaço das ruas e dos lugares para estacionar, vejo-me obrigado a lançar mão da criatividade na hora de escolher o local onde deixar meu carro para atender às demandas que semanalmente me obrigam a dirigir-me ao centro. Via-de-regra, procuro escapar dos estacionamentos pagos (exceto quando chove muito ou quando estou com pressa) e opto por escolher pontos em que o rotativo ainda não chegou com sua ininterrupta e crescente teia de parquímetros, tíquetes e fiscais.
 Nesse ritmo, distancio-me cada vez mais do coração da cidade e obrigo-me a procurar lugares novos onde deixar o carro. É assim que vou descobrindo ruelas, recantos desconhecidos, ruazinhas simpáticas ainda existentes no entorno dos disputados espaços pagos, e vejo novas gentes, descubro portões, anoto mercadinhos, encontro árvores, ouço novos ruídos, sinto cheiros diferentes, identifico alguém que cozinha, um gato cruza meu caminho, uma criança chora ao longe. Ontem vi uma casinha de madeira em cima de um poste, plantada pela vizinhança no meio de uma pracinha, com água e alpiste à disposição da passarada que voa livre pelas imediações. Antes de ontem fui assustado por um cachorro que guardava o portão da residência pela frente da qual passei pela primeira vez. Susto novo, de cachorro desconhecido. Amanhã ou depois, talvez, já sejamos amigos, enquanto ainda conseguir estacionar nas proximidades.
E daí, caminho. Ando quadras e quadras até meus destinos profissionais, atendendo assim, por tabela, às orientações médicas de enfrentar o sedentarismo e mexer musculatura, pulmão, coração e também a mente e o espírito, doutor, não esqueçamos deles ao falarmos sobre saúde. Porque é preciso saber buscar os oásis de humanidade mesmo em meio ao aparentemente selvagem crescimento urbano de uma cidade como a nossa. E eles existem, basta ter olhos e disposição para vê-los. Fazem bem para corpo e alma. Recomendo.

 (Crônica publicada no jornal Pioneiro em 9 de janeiro de 2016)

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