quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Males da alma

Com seis anos de atraso, consegui enfim assistir ao documentário “Simonal – Ninguém Sabe o Duro Que Dei”, de 2009, dirigido por Micael Langer, Calvito Leral e Cláudio Manoel. Consegui ver porque deparei com o material sendo exibido em um dos (raros bons) canais da tevê por assinatura, noite dessas, zapeando sem rumo no sofá da sala. E aprendi algumas coisas. Várias. Uma delas, compartilho a seguir.
Mas, antes, vamos às informações para situar um pouco o personagem, o cenário e a trama. Wilson Simonal (1938 – 2000) foi um cantor que fez muito (mas muito) sucesso nas décadas de 1960 e 1970 no Brasil e também no Exterior, na época em que estouravam movimentos musicais e culturais como a Jovem Guarda, o Tropicalismo, a Bossa Nova. Dono de uma voz singular e de um carisma nato abrangente, Simonal hipnotizava multidões nos shows ao vivo dos festivais de música, nos estádios, nos programas de televisão em que participava e que comandava. Era capa de revista, tudo o que fazia virava notícia e ganhava muito dinheiro. Era namorador e seu círculo de amizades incluía celebridades de outras áreas, tendo ficado amicíssimo de Pelé, por exemplo.
Porém, no meio artístico e musical, despertava inveja, muita inveja. Despertava aquela inveja humanamente óbvia que nasce na baixeza da alma dos que se sentem ofuscados e sofrem com o sucesso alheio. Fazer o quê. Simonal deixava latindo os invejosos e, tal qual caravana, seguia em frente. O problema é que o sucesso se transformou em megalomania e soberba, e aí é que surgiu seu calcanhar de Aquiles. Certa feita, desconfiou que seu contador o estava roubando e, sem mais, pediu que agentes da polícia repressiva (era a década de 1970, em plena ditadura militar) sequestrassem seu funcionário, dessem-lhe uma surra e o forçassem a confessar. Assim foi e, quando o caso chegou à imprensa, Simonal, misturando ingenuidade com megalomania, declarou que era poderoso, que era amigo de figuras ilustres da ditadura e que, sim, era até informante dos órgãos de repressão.

Falou para se vangloriar e meter medo, e nada daquilo era verdade. Mas foi o que bastou para ser banido dos shows, perder contratos, desaparecer da mídia e cair no ostracismo, até morrer esquecido décadas depois, alcoólatra. Tudo por causa de um arroubo de megalomania. Inveja e soberba, meus amigos, matam. Por dentro e por fora. Temos de cuidar de nossas almas assim como cuidamos do corpo.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 16 de dezembro de 2015)

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