sábado, 12 de dezembro de 2015

Curvas da vida


A vida pode ser descrita como uma caminhada. Todos sabemos disso. Todos já vimos, ou ouvimos, ou lemos ou mesmo pronunciamos essa metáfora mais do que batida: “a vida é como uma caminhada”. Sim, porque, assim como qualquer trajeto que se imponha à nossa frente, também a existência é repleta de pedras no meio do caminho (como nos avisa insistentemente o poeta), curvas acentuadas, solavancos e buracos (vida de brasileiro, então, é repleta de buracos no meio da pista, assim como estradas brasileiras), encruzilhadas, barbeiros na contramão, súbitas porteiras fechadas, pedágios (ah, como brasileiro paga pedágio na vida e nas estradas...), poeira a ser engolida, animais na pista e assim por diante.
A metáfora ligando vida a caminho, como vimos, tem lógica e razão de ser, tamanho o número de pontos de convergência simbólica entre os dois elementos. Vida e jornada, vida e viagem, vida e trajeto a ser cumprido, tudo isso vale e nos ajuda a compreender melhor (ou atenuar o eventual peso) esse fenômeno inexplicável que se dá com todos os que nascem e que vão acumulando milhas de rodagem no cenário da existência: o ato de viver. Viver é dirigir-se pelas curvas desse caminho, optando pela direção a seguir quando chegam as encruzilhadas, acelerando ou reduzindo o passo, evitando ou sabendo entrar nos buracos, ultrapassando com segurança, observando as regras, essas coisas. A vida é assim. As caminhadas, também.
Talvez seja por isso que tenho tentado desenvolver uma técnica anti-estresse quando me ponho a dirigir meu automóvel pelas ruas da cidade e pelas estradas do Estado, sempre apinhadas de veículos, nem sempre em bom estado de conservação, às vezes em obras, quase sempre frenéticas. Descobri que a ansiedade em relação ao trânsito é o pior inimigo de quem está ao volante. Pior inimigo para sua paz de espírito, para sua saúde física e emocional e para a segurança de si mesmo, dos seus e dos outros. Minha técnica consiste em acreditar que qualquer pequeno contratempo se dá com a intenção secreta de me conduzir com maior segurança ao meu destino final.

Afinal, nunca sabemos o que poderia ter acontecido caso tivéssemos optado pela outra via na encruzilhada lá atrás. Poderia ter caído em um enorme buraco. Talvez o engarrafamento me tenha livrado disso. A vida, assim como as caminhadas e os trajetos, precisa de leveza. Mas com atenção ao volante.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 12 de dezembro de 2015)

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