segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Um poder de mente

Achei a tática nada menos do que genial e me propus a adotá-la de imediato, pois que acabava de testemunhar por mais de uma vez a sua assombrosa eficácia no período de cerca de duas horas. Em pleno horário de pico, quando o trânsito atinge seus ápices de ansiedade, estresse e aglomeramento, no entorno do meio-dia e logo depois na retomada das atividades no início da tarde, ela, serena e tranquila, conseguiu encontrar vagas para estacionar seu carro três vezes seguidas em diferentes pontos do centro, bem defronte aos locais que precisávamos visitar. Como? Qual o milagre?
“Ora”, ela explicou. “Simples”, prosseguiu. E, daí, desfiou em poucas palavras a revelação da tática mágica a que lançava mão para obter vagas para estacionar o carro em qualquer lugar no conturbado centro da cidade, a qualquer hora do dia. E não se trata de pegadinha do cronista mundano aqui, não, senhora, a senhora anda me tomando por outros, eu não faço esse tipo de coisa com o leitor. Quem? Eu? Quando? Imagina, nunca! Prove! Não, senhora, ela não enfia seu automóvel na primeira garagem paga que encontra no entorno, como a senhora está imaginando que eu vou tascar já na próxima linha, só para ficar do lado de cá das teclas segurando risinho com as mãos e pensando “peguei vocês, peguei vocês”, que eu já disse que não faço esse tipo de coisa. A personagem-motorista aí da minha crônica detém mesmo uma estratégia incrível para conquistar vagas no meio-fio, em plena via, e vou revelar do que se trata no próximo parágrafo.

Depois de muito arregalarmos os olhos, minha esposa e eu, que estávamos de carona, ela cedeu em contar seu truque, para o que, por sinal, não foi preciso que insistíssemos muito. “Eu apenas mentalizo que vai haver uma vaga esperando por mim bem na frente do local em que preciso ir, e pimba: chego perto e lá está a vaga, me esperando”. E funciona mesmo. Eu vi, minha esposa também, três vezes em duas horas. Claro, ela confessou que, em certas ocasiões, quando está muito ansiosa e estressada, a coisa não dá certo. Ufa, fiquei aliviado em saber que há uma margem para o humano nessa magia urbana toda. Que é justamente onde se enquadra o meu poder de mentalização de vagas: no coeficiente zero de aproveitamento, porque, sempre que eu chego perto, minha vaga já está ocupada por outro que mentalizou melhor do que eu. Mas juro que ando treinando.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 19 de outubro de 2015)

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