sábado, 18 de julho de 2015

Faltou o manual

Nós, que nascemos e vivemos, temos muitas coisas em comum. É por isso que o ato de compartilhar as experiências que vamos adquirindo ao longo da olimpíada da vida se configura em uma prática humana importante, dadivosa, exemplo de generosidade e altruísmo, de cuidado para com o outro, enfim, essas coisas tudodebom de que somos capazes de fazer pelo próximo de vez em quando. Desde que o próximo não se aproxime muito, até que gostamos dele, não é verdade? Somos humanos, não passamos de seres humanos, não exijam demais da gente...
Pois bem: nisso de termos muito em comum, nós, seres humanos que vivamente habitamos o planeta, existem algumas coisas que parecem mesmo ser inerentes ao perfil da maioria. Entre elas, a reclamação constante que fazemos relativa ao fato de que a vida não vem com manual. Não existe manual para nada, no que tange às experiências cruciais do ato de viver a vida humana. Existem, sim, regras de conduta civilizatória, criadas na tentativa de proporcionar aos seres humanos uma coexistência em sociedade minimamente viável, como as leis civis, os mandamentos divinos, os códigos morais, de ética e de comportamento, esse negócio todo. Mas manual, que é bom, e de cuja falta reclamamos em uníssono de polo a polo, não existe.
Não há manuais sobre como criar um bebê; sobre como lidar com um adolescente; sobre como lidar com os pais, sendo um adolescente; sobre como manter um casamento sem estresses; sobre como desfazer um casamento sem estresses; sobre como ser solteiro sem estresses; sobre como ser eternamente feliz; sobre como ficar rico sem ter de escrever um livro com sete dicas sobre como ficar rico; sobre como ser amado por todos; sobre como evitar ter de ser amável com todos para poder ser amado por todos; enfim, a vida não vem com manuais, todos nós reclamamos disso, temos isso em comum.
O que é uma grande besteira, porque, mesmo que a vida viesse com manuais, nós não os leríamos e os jogaríamos para o fundo da gaveta, assim como fazemos com os manuais do forno de micro-ondas, do smartphone, do notebook, da geladeira, do automóvel. Fazemos com a vida o mesmo que fazemos com um smartphone novo: vamos apertando os botõezinhos para ver no que vai dar. No fundo, o que mais temos em comum mesmo é essa mania de reclamar de bobagem.

 (Crônica publicada no jornal Pioneiro em 18 de julho de 2015)

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