sábado, 13 de junho de 2015

Refri de maionese

“A vida é como um refrigerante de maionese/ E a vida é como espaço sem sala/ E a vida é como bacon com sorvete/ Assim se parece a vida sem você”. Esses versos aí configuram a abertura de uma canção do roqueiro nova-iorquino Lou Reed (1942 – 2013), intitulada “What´s good” (“O que é bom”, em tradução livre), abertura do álbum “Magic and Loss”, lançado em 1992. Verborrágica e repleta de teses e conceitos poéticos, como toda a excelente obra de Lou Reed, a letra fala sobre o sentido da vida que, em última análise, é boa, porém, às vezes, injusta.
Ao elencar uma pequena série de conjunções estranhas como refrigerante de maionese, que causam rejeição só de pensar, o músico está querendo intensificar, a partir do contraste, como a vida dele (ou a do personagem da canção) seria sem sentido sem a presença da outra pessoa, provavelmente a namorada ou esposa ou amante. A vida sem ela seria sem sentido igual a um refrigerante de maionese, ou igual a espaço sem salas ou ainda igual a bacon com sorvete. Se bem que eu, fissurado por maionese como sou, encararia um copo de refrigerante produzido a partir desse condimento, só por curiosidade. Descendente de germânicos, creio que também arriscaria dar uma garfada e provar um bocado composto por uma bela tira de bacon frito acompanhado por uma bolotona de sorvete, misturando doce com salgado. E espaço sem salas, bem, vivam os parques, não é mesmo?
Mas a ideia não é desautorizar a poesia do Lou Reed, pelo contrário. Concordo com a qualidade das metáforas que ele criou para compartilhar a sensação de estranhamento que seria a vida sem a pessoa amada ao lado. O que fico pensando é que qualquer pessoa que escute a letra poderia completá-la, agregando mais elementos de uma lista pessoal de coisas sem sentido, sem sabor, que funcionariam como sinônimos de estranhamentos. Entra aí a observação feita dia desses por um amigo meu escritor aqui de Caxias: “crônica sem título é igual a namoro sem beijo”.
Taí, uma frase bem ao estilo Lou Reed, que diz tudo. Mas nada contra quem opta por namorar sem beijar, como aquele casal de Macatuba (SP), a Géssica e o Rafael, que casou após dois anos de namoro sem beijos nem toques, e foi notícia nacional. Havemos de respeitar as opções de cada um, pois a cor da vida depende dos olhos de quem a vive. E me passa prá cá esse copo de refri de maionese, que me deu sede.

 (Crônica publicada no jornal Pioneiro em 13 de junho de 2015)

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