quinta-feira, 18 de junho de 2015

A um poeta

O mundo seria pequeno demais, tosco demais, árido demais, rústico demais, absurdo demais, selvagem demais, angustiante e opressor demais, infeliz demais, triste demais, pesado demais, impraticável e sem sentido se não fosse a Poesia. A Poesia é o sopro que areja a existência de tudo, é o bálsamo que lubrifica o atrito entre as engrenagens que compõem o mundo, é a panaceia vital capaz de permitir o fluir da seiva intangível que confere, se não sentido, pelo menos o conforto e o aconchego necessários para que o peso do existir tenha leveza e possa alçar do solo duro os pés que, então, ganham como que asas. A Poesia permite voar e transcender as limitações do corpo, tocando sutilmente os intransponíveis limites da eternidade.
A Poesia redime a Vida e domestica a Morte, já que esta não pode ser vencida. Domestica e ludibria, porque, a partir de seus frutos, que são as Artes, consegue manter viva a chama do Poeta por meio da permanência de suas Obras na Memória coletiva. Enquanto houver quem cante o canto do Poeta, enquanto houver quem leia suas linhas, quem contemple suas telas e esculturas, quem escute a sua música e a sua voz, quem assista às suas encenações e produções visuais, quem viaje em suas fotos, quem reflita sobre suas propostas, a finitude seguirá sendo protelada e o pulsar da Vida continuará achando caminhos para fluir como sangue vital por veias infinitas.
A Poesia não se extingue junto com o último suspiro do Poeta. Justamente por ter sido Poeta é que ele consegue erigir em vida um castelo sólido de tijolos de brisa, amalgamado na argamassa da criatividade e da inspiração, fundeado nas entranhas da alma e, por isso mesmo, inabalável, irredutível e indestrutível. O Castelo da Obra do Poeta permanece e permanecerá, porque foi construído em Poesia, a mais perene e sólida matéria já concebida pelos deuses, pelos anjos e pelos homens. O Poeta se vai e dele sentiremos imorredouras saudades. Mas amaciaremos essas saudades contemplando a existência que fica, amparados pela Poesia que o generoso Poeta nos deixa de legado. A ele, portanto, teremos sempre graças a dar. Temos de ser gratos aos Poetas, de todas as Artes.

Entre eles todos, gratidão especial ao escritor florense Flávio Luis Ferrarini, que desde a última terça-feira transformou a si mesmo em eterna metáfora de Vida.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 18 de junho de 2015)

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