terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Sem cérebro no brejo

Sim, concordo, é verdade que a criatividade é um instrumento poderoso para auxiliar o cidadão a sair de enrascadas, a driblar uma saia justa, a solucionar um problema inesperado. Também a presença de espírito é eficaz em momentos como esses. Ah, e não esqueçamos a importância da experiência, pois é ela quem nos fornece os padrões de comparação a partir de situações similares já vivenciadas anteriormente e aciona os gatilhos necessários para que consigamos resolver a contento a questão que ora se apresenta.
Criatividade, presença de espírito, experiência. Uma tríade poderosa a ser evocada e vir em auxílio quando a água bate na canela e vai subindo, quando a vaca se põe a escorregar na beirada do brejo, quando a catástrofe parece irreversível. Concordamos nisso, a senhora leitora, o prezado leitor e eu. Porém (é preciso haver um “porém”, um “mas”, um “entretanto”, um “contudo”, um “todavia”, para que haja crônica, ora pois), vou lhes dizer uma coisa: isso nem sempre basta. Existe outro elemento que, se não estiver presente, a vaca acabará sim atolando no brejo, a água subirá as canelas e o encobrirá todo, a catástrofe se concretizará. E vou revelar qual é esse elemento, mas, antes, ilustrarei com um exemplo, para que a crônica ganhe sabor e fique mais bacaninha.
Eis o exemplo: final de semana em casa, disposto a produzir uma saborosa torta de palmitos para inaugurar o novo forno elétrico recém-chegado e fazer surpresa para a turma. Apressado, ansioso, desplugado, li a receita certinho, mas meu cérebro traduziu tudo errado. No lugar de farinha de trigo, meti-lhe colheradas de amido de milho; ao invés de três quartos de xícara de óleo, tasquei-lhe três ou quatro xícaras; o fermento estava vencido, mas foi assim mesmo. Resultado: uma catástrofe empapada, gordurosa, flácida, xoxa e incomível. Foi, de fato, uma surpresa. A torta foi para o brejo mas, ao menos, o forno provou funcionar direitinho.

O que não funcionou foi o meu cérebro. Esse, senhoras e senhores, é o tal do elemento secreto fundamental para que qualquer situação seja remediada. Sem a presença desse ingrediente – o cérebro – funcionando, o brejo fica lotado de vacas atoladas. Eu sei porque recém estou voltando de lá.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 3 de fevereiro de 2015)

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