terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Rumo a Marte

Meu amigo Argentino está apavorado. Quem conhece Argentino há bastante tempo, como eu, sabe que estar apavorado por alguma razão qualquer chega a ser a condição natural de ser e estar de Argentino, mas desta vez a coisa parece ser séria. Ao menos, o pavor é bem sério, apesar de a razão que o motiva continuar sendo, digamos, uma razão típica das de Argentino. Problema é que, quando ele está assim, ele via de regra bate lá em casa, e aí, quem escuta sou eu...
Fissurado por assuntos relativos à astronomia, Argentino foi um dos primeiros brasileiros (Argentino é argentino, mas possui dupla cidadania, explicado?) a se inscrever no projeto Mars One, iniciativa de um empreendimento multimilionário norte-americano que está desenvolvendo uma viagem tripulada rumo ao planeta Marte, prevista para ocorrer em 2023. A ideia é construir bases no planeta vermelho para colonizá-lo, em uma viagem de sete meses de duração sem nenhuma parada nem sequer em Vênus para fazer xixi e comprar cebolitos. Duzentas mil pessoas de todas as partes do mundo já se inscreveram (dez mil do Brasil, Argentino entre elas) para se candidatar a compor o pioneiro grupo inicial de quatro astronautas que irão para lá, entrar para a história.
O que não se sabia é que podem também entrar pelo cano, uma vez que só agora foi divulgada a informação de que a viagem é sem volta, ou seja, não existe guichê de vendas de bilhetes rumo à Terra, em Marte. Quem for, vai ficar. Igual aos imigrantes alemães e italianos que embarcaram em navios nas famosas viagens de 33 dias pelo Oceano Atlântico rumo à América no final do século 19. Raros foram os que conseguiram pisar de novo na terra natal. Já pensou, passar o resto de seus dias em Marte, na companhia de três outras pessoas somente, sem supermercado, sem tevê a cabo, sem internet, sem parquinho, sem praia, sem espiga de milho cozido, sem caipirinha, sem a edição número 23 do BBB Brasil?

Argentino está apavorado porque tem convicção de que já figura na lista dos quatro selecionados para a missão (Argentino é um ser de convicções) e não sabe como fazer para cancelar a inscrição. Não vai poder nem receber cartas da gente. Coitado do Argentino. É o que dá, mover-se por impulso...
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 10 de fevereiro de 2015)

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