segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Eu sou a régua

Uma vez que todos nós somos seres autocentrados, egocêntricos e autorreferentes, não é de se estranhar que passemos nossas existências alimentando preconceitos e maus julgamentos sobre as outras pessoas embasados no fato de que as analisamos e as medimos a partir das qualidades que pressupomos existir em nós mesmos. Nós próprios julgamos ser a medida para o que há de melhor na humanidade, de mais correto, mais bonito, elegante, charmoso, inteligente, espirituoso, politicamente correto, engraçado, esperto e fofo. Ou vai me dizer que você não acha tudo isso de você mesmo?
O problema é que ninguém está se dando ao trabalho, nesses dias de  preocupações com a superpopulação do planeta, de também aferir as consequências por certo danosas da proliferação desenfreada de egos humanos a inflarem e exigirem mais e mais espaço por sobre a superfície da Terra. Porque a coisa, como podemos ver analisando friamente o entorno social que nos cerca, funciona normalmente assim: você é o centro do universo, e tudo gira em torno de seu umbigo, seja ele do tipo fechadinho, ou puxado para fora igual a laranja-de-umbigo ou avaletado para dentro. Nossos umbigos atraem tudo para o seu próprio centro, reproduzindo a imagem dos buracos negros, que absorvem, dizem, até mesmo a luz. Umbigos iluminados, portanto, esses nossos.
As pessoas à nossa volta são mais feias ou mais bonitas do que a gente; ou mais magras ou mais gordas; ou mais espertas ou mais burras; ou mais felizes ou mais sofredoras; ou mais abonadas ou mais miseráveis; ou mais sortudas ou mais azaradas. Mas sempre a régua para medi-las somos nós mesmos. Compomos, nós, seres humanos, um agrupamento de sete bilhões de centros do universo se entrechocando sobre a superfície da Terra. “Fulano está acima do peso”, dizemos nós de Fulano, que pesa 200 quilos, para a alegria de nossos esbeltos 190. “Beltrana é uma es-can-da-loooooooo-saaaaaaaaaa”, berramos para as amigas no salão de beleza contra Beltrana (que está obviamente ausente), fazendo nosso singelo escandalozinho.

Nossa sorte é que não somos iguais uns aos outros. Apenas semelhantes em nosso cultivo ao narcisismo.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 9 de fevereiro de 2015)

Nenhum comentário: