Alegando questões de segurança e
de garantia de privacidade, a empresa que administra minha conta de e-mail anda
dificultando meu acesso à caixa de entrada, solicitando, de quando em vez, que
eu atualize informações de meu cadastro. Tento abrir os e-mails e pá: explode
na tela do computador uma caixa pedindo que eu insira o número de meu telefone
celular, recurso que alegadamente servirá para que eu tenha maior controle
sobre o acesso aos meus dados.
Tudo muito lindo, especialmente
porque a impressão que passam ao usuário é de que estão oferecendo uma forma de
garantir a segurança de seus dados virtuais. Pelo que entendi, eu receberia
senhas via mensagem em meu celular, para acessar minha conta em caso de
bloqueio. Quem a bloquearia? A própria empresa administradora da conta, pelo
que entendi. Para isso, devo fornecer meu número de celular, para que possa
receber as senhas. Certo, ok. Tudo segue muito lindo. Só tem uma coisa: e se eu
não tiver um aparelho de telefone celular?
Quem disse que eu tenho a
obrigação de ter um celular? Onde está a lei que me obriga a ser proprietário
de um aparelho desses? Onde está, aliás, a lei que me obriga a ser proprietário
do que quer que seja? E se eu for um bicho-do-mato que não quer celular, que
não assiste à televisão, que não acompanha o BBB, não escuta axé-music, essas
coisas? Não posso ter conta de e-mail se eu não tiver celular? Mundo estranho
esse que anda sendo construído...
Mas antes que se espantem demais
comigo, vou logo esclarecendo: sim, eu tenho telefone celular, claro que sim.
Não sou tão bicho-do-mato assim. E também assisto a (alguns) programas de
televisão (o BBB não figurando na lista, saliente-se). Mas ainda pretendo
administrar eu mesmo a quem e quando desejo informar o número do meu telefone.
Para os familiares, amigos e clientes, obviamente que sim. Para uma estranha
empresa administradora de e-mail, não, obrigado. A sociedade que está sendo
gestada aí fora está se apossando de nossa privacidade de uma forma que
ultrapassa limites que, a meu ver, configuram uma afronta aos direitos humanos.
Quem precisa assistir ao BBB na
tevê, se o monitoramento de cada um de nós está se dando ao vivo e a cores na
vida real, a cada golfada de ar que respiramos?
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 26 de fevereiro de 2015)
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