quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Batata quente, batata fria

É batata. Ao menos, comigo, é sempre batata. Eu já posso contar que vai ser batata, e não tem outra: acaba sendo batata mesmo. A situação chega a se assemelhar com aquela máxima do Barão de Itararé (Barão de Itararé era o pseudônimo do escritor e jornalista gaúcho Apparício Torelly, falecido em 1971, que fazia sucesso com suas frases de efeito), que dizia assim: “De onde menos se espera, dali é que não sai nada mesmo”. Pois em se tratando de mim, é mais ou menos assim: batata pura.
A tal da batata se dá sempre que vou receber visitas para o jantar. Sempre. Não importa se a visita é chegada (mãe, sogros, cunhados, amigos íntimos) ou não tão chegada (amigos não-íntimos, inimigos, completos desconhecidos, astros de Hollywood). A batata vai se materializar sem dó nem piedade, porque sofro da maldição da batata. Ela varia um pouco, porque uma das características da batata é ser criativa e sempre conseguir me pegar desprevenido, de calças curtas ou com as calças na mão. Nunca consigo, portanto, me prevenir a contento contra a batata, apesar de meus reconhecidos esforços.
Noite dessas, ao receber visita (da categoria dos íntimos), a batata aprontou em relação à temperatura ideal daquilo que deveria ir para a mesa. Traduzindo em miúdos: o que deveria estar quente estava frio e o que deveria estar gelado estava quente. E não houve jeito de inverter a equação, pois que era batata, estava dado que seria assim e assim foi. Os filés à parmegiana e a lasanha aos cinco queijos, adquiridos previamente em estabelecimento local de reconhecida qualidade, não houve Cristo (e forno) que os fizesse adquirir a temperatura ideal de borbulha para serem devidamente saboreados à mesa. Por sua vez, não houve turbo-congelamento do freezer ou baldinho de gelo que conseguisse deixar o espumante brut, obtido diretamente na cave artesanal de produtor bassanense, na gelada temperatura que a quentíssima noite exigia.

Assim, brindamos com espumante morno e saboreamos lasanha gelada, alegres com o reencontro, esse sim, devidamente caloroso, na temperatura ideal que o cultivo das relações exige e requer. De resto, no entanto, foi, como sempre, batata. Não se pode ter sempre tudo o que se quer na vida, já dizia Mick Jagger...
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 29 de janeiro de 2015)

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