domingo, 18 de janeiro de 2015

A inconstância

Porque não sou filósofo, não sei como a Filosofia trata do assunto. Porque não sou psicólogo, desconheço a abordagem psicanalítica do tema. Porque não sou erudito, fico à margem das elucubrações que me permitiriam compreender as nuances do problema. Apenas porque sou um eterno estranhado com as coisas do mundo é que penso nessas coisas, sem concluir coisa alguma. Falo aqui da inconstância, esse atributo que, a meu ver (não sei se também no dos filósofos, no dos psicólogos e no dos eruditos), é a origem de muitos males.
Vejamos, por exemplo, a senhora minha esposa. Dia desses andou ela descobrindo, por meio de indicações de uma cunhada, a existência de um produto fabricado para o lar que haveria de revolucionar a concepção de espaço dentro de nossa casa. Os lares modernos, como bem o sabem arquitetos e projetistas, são tecidos pela junção de peças pequenas que exigem a confecção de mobília sob milimétrico encaixe, e assim se dá, com grande ênfase, em nosso quarto de casal, onde uma cama-box faz as vezes de roupeiro útil para que dentro dela sejam guardados cobertores, travesseiros extras, ventilador, caixa de ferramentas e mil e outras coisas que, de outro modo, estariam a atravancar os corredores e a dilapidar nossa paciência.
O objeto maravilhoso esse que a esposa (minha) descobriu por indicação da cunhada (nossa) é um saco plástico dentro do qual você dispõe os cobertores e casacões que só ocupam lugar nos roupeiros e se tornam inúteis no verão e que, depois de fechado, retira-se-lhe o ar de dentro com o sugar do aspirador de pó. O vácuo vai minguando aquele pacote todo até ficar com cerca de um terço do tamanho, os cobertores e casacos magicamente achatados ali, fininhos, fininhos, e depois guardado dentro da cama-box no espaço similar ao de um lençolzinho. Genial!

Só que, madrugada dessas, fui acordado de supetão com a cama-box sendo herculeamente erguida por minha esposa comigo em cima, de onde quase fui arremessado para baixo, porque ela, com frio, precisava do cobertor que estava dentro do saco a vácuo. Terrível essa inconstância. Como, senhora? Estou a reclamar da esposa? Não, senhora, imagine! Estou indignado é com a inconstância do tempo nessa cidade!
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 17 de janeiro de 2015)

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