domingo, 27 de julho de 2014

Os extintos

Dia desses comentei aqui a respeito da profissão de carteiro, que está em vias de extinção em função do estabelecimento definitivo da comunicação virtual nas relações humanas, em detrimento do envio físico de cartas, documentos, faturas, mensagens, cartões de felicitações, cobranças, xingamentos etc. Parei para refletir sobre isso em decorrência da leitura (pela internet, claro) de um relatório divulgado por um instituto de pesquisas norte-americano, que elencava as dez profissões que sofrem maior risco de extinção nos próximos anos, devido a motivos diversos.
A de carteiro era só uma delas, a que estava no topo da lista, mas tem outras nove. Em segundo vem a profissão de agricultor. Deve-se levar em conta que a lista se debruça sobre a realidade dos Estados Unidos, onde o processo de mecanização dos trabalhos nas lavouras e nos campos avança em ritmo acelerado, transformando em quase realidade a antiga máxima de que “é o olho do dono que engorda o boi no pasto”. Logo, caberá aos seres humanos apenas ficarem olhando mesmo para o pasto, sem terem de fazer nada. Um quadro assim ainda levará muito tempo para se tornar realidade no Brasil, mas, como gostamos de imitar os americanos em tudo, é bom ficarmos atentos...
Na sequência vêm as profissões de leitor de medidores (aferição que passará a ser feita automaticamente pelas empresas fornecedoras de água, luz, gás); repórter de jornal impresso (aí entro eu, jornalista focado justamente na mídia impressa; em alguns anos, deverei estar empalhado e preservado em algum museu histórico, exposto à visitação pública, de bloquinho e caneta à mão); agente de viagens (você vai organizar por conta própria, de casa, via internet, todo o seu pacote de viagem); lenhador (óbvio, com a extinção das florestas, quem vai cortar o quê?); comissário de bordo (voaremos desacompanhados das aeromoças no futuro); operador de furadeira (isso nas indústrias automatizadas; aqui em casa, continuo furando eu mesmo as paredes para os quadros); funcionário de gráfica (de novo a automatização) e fiscal de impostos (não, nada a celebrar: os impostos continuarão sendo cobrados e seu pagamento devidamente fiscalizado, mas por programas de computador).

Frente a esse quadro todo, procuro alguns alentos. Enquanto houver flores e jardins, não se extinguirá a profissão de florista. Enquanto houver sensibilidades entre as pessoas, não desaparecerão as atividades dos artistas. E enquanto houver cabelo e barba, não sumirão os barbeiros, para o bem de nosso visual em sociedade. E enquanto houver sol, haverá lugar para os otimistas, mesmo que isso não seja profissão. Ao menos, é profissão de fé.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 26 de julho de 2014)

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