segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Em defesa da sombrinha

Qualquer um que precise gastar sola de sapato pelas calçadas da cidade por motivos profissionais ou quaisquer que sejam, nesses inclementes dias veranis, sabe muito bem que o sol não anda para peixe. Estranhou a comparação? Pois experimente deixar um peixe ao sol sobre a calçada em plena Sinimbu, para ver o que acontece.
Estamos a vivenciar aqui, nessa nossa (até então) sempre fresquinha Serra, calorões dignos de concorrer com o clima da mormacenta Porto Alegre, da abafada Santa Maria e de outras quenturas mais tradicionais do Estado. Pingando sob a concorrida sombra das marquises das lojas na Avenida Júlio de Castilhos, fico a imaginar se a neve com que o mês de agosto do ano passado nos brindou não teria sido uma alucinação coletiva. Se visto uma camisa vermelha para perambular rumo a uma reunião, me sinto como se fosse um picolé de picanha a verter água pelo centro da cidade. Se me enfronho em uma camisa preta, tenho a sensação de ter me travestido em um carvão de churrasco ambulante.
Via de regra, ao sair de casa apressado catando óculos escuros, carteira, chaves, pasta, caneta e moedas, acabo esquecendo de lambuzar braços, pescoço e rosto com o protetor solar, o que me rende certeiros queimões do sol e justas xingadas da esposa (ambos me deixam corado). Nessas ocasiões, derretendo impunemente e a olhos vistos em público, fico a me perguntar por que diabos não trouxe junto o guarda-chuva, para me proteger da insolação?
Por que cargas d´água a população contemporânea abandonou o uso das sombrinhas nos dias de sol de camelo, uma vez que o apetrecho já foi tão usual e útil em décadas passadas? Afinal de contas, o nome do artefato revela seu uso: sombrinha. Ou seja, foi criada exatamente com o intuito de proporcionar uma sombra particular e ambulante, que acompanha a cabeça do proprietário por onde quer que ele perambule, sem ter de ficar disputando centímetros de alívio sob as marquises ou as árvores, essas cada vez mais escassas em nossos centros urbanos.

Faço aqui o lançamento de um libelo (sempre quis escrever “libelo”) a favor da volta indiscriminada das sombrinhas ao nosso convívio urbano. E que sejam usadas indiscriminadamente por homens e mulheres que não desejam ter seus miolos fritando a qualquer circuladinha de nada pela Praça Dante. Quem me vir, verá...
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 3 de fevereiro de 2014)

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