sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Anjos no limite

Agosto ganhou fama de “mês do desgosto” na cultura popular não apenas devido à rima fácil e de gosto duvidoso, mas especialmente pelo fato de as pessoas imaginarem que aquele período do ano é mais propício à concretização de tragédias. Claro que não há nada de científico nisso, mas, mesmo assim, tem quem goste de se impressionar com o poder misterioso das coincidências, tentando pinçar nelas significados subliminares e recados sobrenaturais, o que faz nascerem mitos e crendices.
Digo isso porque fico aqui a matutar sobre a estranha onda recente de acidentes envolvendo celebridades que se botam a esquiar nas partes nevadas do mundo e acabam se dando mal, muito mal. O multicampeão de Fórmula-1 alemão, Michael Schumacher, parece ter aberto a temporada ainda ao findar de 2013, em dezembro passado. Continua internado em estado crítico, após uma queda nos Alpes franceses. Poucos dias depois, veio à tona a notícia de que a chanceler alemã, Angela Merkel, também havia, por aqueles dias, fraturado a pélvis em um acidente esquiando na Suíça. Agora, foi a vez da ginasta brasileira Laís Souza sofrer um trauma severo na coluna cervical ao esquiar em Salt Lake City, nos Estados Unidos. Por causa disso, sua participação nas Olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro está desde já comprometida.
Não me atenho às coincidências envolvendo a prática do esqui e as celebridades, afinal, acidentes em pistas de esqui devem acontecer a toda hora, atingindo pessoas comuns e anônimas. O que me intriga é o mistério da motivação que leva algumas pessoas a se arriscarem além da conta, na busca às vezes impensada pela superação de limites pessoais em nome de nem imagino o quê.

Nos três casos citados, a informação é de que nenhum deles estava esquiando em alta velocidade e tampouco realizando manobras arriscadas. Certo, tudo bem. No entanto, independentemente da intimidade de cada um com aquele esporte, acabaram sendo vítimas de um risco calculado. Precisavam disso? E o que as diferencia do cidadão comum que exagera na velocidade na estrada, que dirige após ingerir bebida alcoólica, que ultrapassa em local proibido? Por que precisamos constantemente testar limites? Para mim, o sinal, se é que existe algum nisso tudo, é mais prosaico: o que tem limite mesmo é a onipotência dos anjos da guarda.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 31 de janeiro de 2013)

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