Por que o escritor escreve? Por que o músico compõe? Por que o pintor
pinta e o escultor esculpe? Por que, enfim, os artistas colocam em ação a
imaginação para criar elementos que originalmente não existem no mundo que os
cerca? Questões como essas costumam vir à tona quando se debate a origem do
impulso que move o artista a produzir arte. A resposta, a meu ver, é simples:
porque o mundo real não basta para conferir plenitude à nossa existência.
O escritor catarinense radicado no
Paraná, Cristóvão Tezza revela, em seu recente livro “O Espírito da Prosa”,
que, quando criança, ficava tão encantado com a leitura das obras de Monteiro
Lobato que, logo após fechados os livros, desenhava os personagens do Sítio do
Picapau Amarelo em um papel, recortava as figuras e representava histórias com
elas em um teatrinho confeccionado em caixa de sapatos. A arte que ele lia nos
livros não lhe bastava. Então, criava novas aventuras que não constavam nas
páginas de Lobato e as encenava para si mesmo, na solidão de seu quarto, em
Curitiba.
Em Ijuí, na Rua dos Viajantes em que morei toda a infância e
adolescência, a solidão de meu quarto servia de palco para algo semelhante. Com
uma tesourinha de ponta arredondada, eu recortava dos gibis as figuras dos
super-heróis de minha preferência e brincava com eles em cima da colcha da
cama, criando também novas aventuras que iam além das tramas publicadas nos
quadrinhos. Para mim também a arte que vinha impressa não me bastava, eu
precisava ir além, criar os meus próprios enredos, as minhas tramas.
Recentemente uma leitora me escreveu relatando suas sensações após
visitar uma mostra de fotografias. Ela percebeu “que o mais lindo de cada foto
era exatamente aquilo que não constava nela, mas o que era apenas sugerido por
ela”. Assim, concluiu que “as obras de arte sempre estão inacabadas e nós, os
apreciadores, tornamo-nos coautores delas”. Justamente por termos essa
capacidade inerentemente humana de ampliar o mundo artístico que nos cerca é
que somos também dotados do poder de transformar nossas próprias vidas em obras
de arte. Na vida, no entanto, não somos coautores, mas, sim, os protagonistas.
É preciso dar pinceladas certeiras.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 14 de setembro de 2012)
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