sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Mistérios à vista


Quem não aprecia um mistério? Eu aprecio. Os mistérios conferem um tempero picante ao comum de nossas existências, quebra a monotonia da rotinização do cotidiano, instiga a curiosidade, excita a imaginação, desentorpece os sentidos, açula a inteligência, abre as cancelas para o livre fluir da adrenalina do espírito. Os mistérios produzem a saudável expectativa que move nossa ação no sentido de desvendá-los ou, na impossibilidade de fazê-lo, de passar a vida deliciando-se com a construção de teorias que os expliquem.
A repetitiva transmutação do dia em noite já foi mistério para os primevos seres humanos que rachavam os pés sobre os pedregulhos da Terra jovem e, para amansar o terror da incompreensão que aquela magia gerava no íntimo de suas nascentes almas, criaram os ritos, dos quais surgiram as religiões e a compreensão do divino. Os mistérios da natureza inspiraram mentes que gestaram as alquimias e depois as ciências, e os do espírito seguem gerando buscas que dão à luz as humanidades e as artes. Pobres dos que não cultivam mistérios, pois, repletos de certezas, colocam cadeados nas portas que lhes dariam acesso ao mundo infinito do maravilhamento.
De minha parte, ando há alguns anos duelando com um mistério que me alvoroça o espírito sempre que paro o carro em um dos semáforos que regulam o tráfego no acesso principal ao município de Veranópolis, no entroncamento da RST-470. Enquanto o sinal não abre, minha atenção invariavelmente é atraída pela placa que indica o nome de uma loja, situada à direita de quem segue rumo a Nova Prata, vindo de Bento Gonçalves, prometendo o ingresso em um universo inacreditável. Afinal, o que será que me espera quando eu finalmente tomar a coragem de mudar o rumo e adentrar as portas de “O Fantástico Mundo das Variedades”? Encontrarei ali tudo o que sempre busquei na vida e até hoje não encontrei? Objetos raros e perdidos? Lembranças apagadas pelo tempo? Amigos esfumaçados pelo desencontro? Ou isso e ainda mais tudo aquilo que o nome da loja permitir imaginar? Ainda não ousei desviar a rota e ingressar ali. Tenho achado mais prudente manter viva a chama de pelo menos esse mistério...
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 3 de agosto de 2012)

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