domingo, 17 de outubro de 2010

A medida de nossos umbigos

Uma vez que todos nós somos seres autocentrados, egocêntricos e autorreferentes, não é de se estranhar que passemos nossas existências alimentando preconceitos e maus julgamentos sobre os outros embasados no fato de que os analisamos e os medimos a partir das qualidades que pressupomos existir em nós mesmos. Nós próprios somos a medida para o que há de melhor na humanidade, de mais correto, mais bonito, elegante, charmoso, inteligente, espirituoso, politicamente correto, engraçado, esperto e fofo. Ou vai me dizer que você não acha tudo isso de você mesmo?
O problema é que ninguém está se dando ao trabalho, nestes dias de recenseamento e de preocupações com a superpopulação do planeta, de também aferir as consequências por certo danosas da proliferação desenfreada de egos humanos a inflarem e exigirem mais e mais espaço por sobre a superfície da Terra. Porque a coisa, como podemos ver analisando friamente o entorno social que nos cerca, funciona normalmente assim: você é o centro do universo, e tudo gira em torno de seu umbigo, seja ele do tipo fechadinho, ou puxado para fora igual a laranja-de-umbigo ou avaletado para dentro. Nossos umbigos atraem tudo para o seu próprio centro, reproduzindo a imagem dos buracos negros, que absorvem, dizem, até mesmo a luz. Umbigos iluminados, portanto, esses nossos.
As pessoas à nossa volta são ou mais feias ou mais bonitas do que a gente; ou mais magras ou mais gordas; ou mais espertas ou mais burras; ou mais felizes ou mais estropiadas; ou mais abonadas ou mais miseráveis; ou mais sortudas ou mais azaradas. Mas sempre a régua para medi-las somos nós mesmos. Compomos, nós, seres humanos, um agrupamento de seis bilhões de centros do universo se entrechocando por sobre a Terra. “Fulano é um gordão mesmo”, dizemos nós de Fulano, que pesa 130 quilos, para a alegria de nossos magérrimos 120. “Beltrana é uma es-can-da-loooooooo-saaaaaaaaaa”, berramos para as amigas no salão de beleza contra Beltrana (que está obviamente ausente), fazendo nosso singelo escandalozinho.
Nossa sorte é que não somos iguais uns aos outros. Apenas semelhantes em nosso cultivo ao narcisismo.
(Crônica publicada no jornal Informante, de Farroupilha, em 15/10/10)

Um comentário:

Ana Seerig disse...

Eis o ser humano: preso em seu egocentrismo. Em maior ou menor grau, discreta ou indiscretamente, todos nos colocamos no centro, em um ou outro assunto, ou em todos, fazendo uma referência aos outros a partir de nós mesmos. E se alguém se disser salvo dessa que é a mais humana característica, ou é louco ou o mais egocêntrico de todos.
Unidos pelo egocentrismo e divididos por ele. Contradição, dúvida, confusão: eis o ser humano.